A definição de refúgio
Historicamente, são características da humanidade a solidariedade, o acolhimento e a proteção às pessoas perseguidas em razão conflitos étnico-raciais, religiosos, políticos, de nacionalidade, entre outros, ou seja, o ser humano é um ser social e se compadece do sofrimento de seu semelhante, exercitando a alteridade, nota-se que com o decurso do tempo essa prática virou um costume internacional.
Segundo Hanna Arendt, em sua obra as origens do totalitarismo: “O homem pode perder todos os chamados Direitos do Homem sem perder a sua qualidade essencial de homem, sua dignidade humana. Só a perda da própria comunidade é que o expulsa da humanidade.” (1979, p.317), ou seja, é a comunidade em que o sujeito está inserido que lhe dá dignidade e não o direito em si, por isso a cada dia um maior número de indivíduos não estão perdendo um direito específico, e sim, a comunidade que lhe assegura esse direito.
Nessa perspectiva, para a garantia desse direito de estar em comunidade, foi criado instituto jurídico de tutela daqueles indivíduos que tiveram por determinados motivos que fugir do seu país de origem, qual seja, o refúgio.
Entretanto, a doutrina passou por um longo período de debate acerca da distinção entre o refúgio e o asilo, que para uns eram expressões sinônimas. Porém, alguns estudiosos defendiam que o instituto do asilo fosse mais amplo, abrangendo o instituto do refúgio considerado mais específico, na ausência de aplicabilidade. Exemplo disso é o tratamento dado pelo Brasil ao direito internacional dos refugiados, que em regra faz a diferenciação entre asilo e refúgio.
“Já na América Latina, o asilo diplomático sempre foi amplamente praticado, provavelmente por causa da constante instabilidade política na região, com sucessivas revoluções e golpes de estado, havendo, assim, a necessidade de se conceder proteção aos chamados criminosos políticos. O asilo diplomático pode também ser concedido nas legações, nos navios, aeronaves e acampamentos militares”. (BARRETO, 2010, p13)
Isto é a América Latina criou o conceito de asilo, derivado do Tratado Internacional de Montevidéu, de 1889, que foi o primeiro a versar sobre o tema, por isso o asilo diplomático é um instituto endêmico da América Latina, assim, em outros países usa-se a terminologia refúgio.
Nessa lógica, o art. 11 da Convenção de Genebra: “todos têm o direito de buscar asilo em função de perseguição e de tê-la concedido. Tal direito não será concedido a criminosos e aqueles cujos atos são contrários aos princípios e propósitos das Nações Unidas”.
Isto é, o direito de asilo não é absoluto, mesmo havendo grave violação dos direitos humanos, materializada através da perseguição, se eventualmente o sujeito que pediu asilo for um criminoso ou macular os princípios da ONU, esta prerrogativa lhe será negada.
Para constar, os objetivos da ONU são: a manutenção da paz e da segurança internacional; a harmonia entre a nações, alcançar a colaboração interestatal para a resolução de conflitos internacionais e estimular de difundir o respeito às prerrogativas da dignidade da pessoa humana e ser o núcleo da harmonia entre os países para o êxito das finalidades em comum.
Nesse caminho, a Constituição Federal de 1988 traz no art. 4º, II o fundamento constitucional para os institutos do refúgio e do asilo político em sentido amplo, quando trata da preponderância dos direitos humanos nas relações internacionais brasileiras.
Já o art. 4º, X, CF/88 em concomitância com os arts. 28 e 29 da lei 6.815/80 (estatuto do estrangeiro) traz a definição do instituto do asilo político em espécie. Por fim, é editada a lei 9.474/1997 para tratar especificamente do instituto do refúgio no ordenamento jurídico brasileiro.
Internacionalmente, comparando-se o regime do asilo com o do refúgio, este último, apesar de ser mais recente, atualmente tem maior abrangência e legislação específica por isso não depende da discricionariedade de um Estado em relação ao outro, e sim, do cumprimento de um determinação legal. A principal similitude entre os institutos do asilo e do refúgio é a tutela da dignidade da pessoa humana.
Hoje, depois de muita discussão na doutrina, chegou-se ao consenso de que todo refugiado é aquele sujeito que sofre perseguição em seu País ou domicílio habitual em virtude conflitos envolvendo questões de raça, nacionalidade, religião, opinião política, catástrofes ambientais, etc, enquanto o asilo político está restringido à perseguição política. Sendo assim pode-se afirmar que apesar de os institutos do refúgio e do asilo terem a mesma origem histórica, desenvolvem-se de forma independente.
Logo, a condição de refugiado já existia antes mesmo da solicitação, assim, o refúgio não é um oferecimento ou acolhimento por parte do Estado soberano a um indivíduo estrangeiro, e sim, o reconhecimento da condição na qual a pessoa já se encontra sem ter para onde ir por conta de motivos alheios à sua vontade.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988
LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil: decisões comentadas do CONARE. Brasília: Ministério da Justiça e ACNUR-Brasil, 2007, p. 24-72.
BARRETO, Luiz Paulo Teles Ferreira. Refúgio no Brasil: a proteção brasileira aos refugiados e seu impacto nas Américas / Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto, organizador. – 1. Ed. – Brasília: ACNUR, Ministério da Justiça, 2010.
ARENDT, Hannah. As origens do totalitarismo. 1973
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