O que é preceito fundamental?
A Constituição Federal de 1988 (CF/88) diz no art. 102, § 1º que compete ao Supremo Tribunal Federal (STF) julgar “a arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”.
Entretanto, a CF/88,
não disse o que significa “preceito fundamental”, sendo assim, omissa e
lacunosa, atribuindo à lei infraconstitucional definir o instituto. A lei que
regulamenta a arguição de descumprimento de “preceito fundamental” (ADPF) é a nº 9.882 de 1999, todavia essa legislação também não conceituou o instituto.
Desta forma, em
decorrência da lacuna legislativa deixada tanto pelo constituinte originário,
quanto pelo legislador infraconstitucional e da ausência de um rol taxativo do
que se entende por “preceito fundamental”, cabe à doutrina e ao STF bater o martelo sobre a definição da terminologia o que resulta em ampla margem
de discricionariedade à Suprema Corte.
Nesse sentido, leciona Bulos:
“Qualificam-se de fundamentais os grandes preceitos que informam o sistema constitucional, que estabelecem comandos basilares e imprescindíveis à defesa dos pilares da manifestação constituinte originária. Podem ser considerados preceitos fundamentais as diretrizes insculpidas no pórtico do art. 12 da Constituição de 1988, quais sejam, a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, da livre-iniciativa, do pluralismo político.” (BULOS, 2014, 334).
Isto é, preceitos fundamentais são a essência ou a estrutura da CF/88, são as normas constitucionais que dão coerência, racionalidade e segurança ao ordenamento jurídico. Assim a ADPF é um instrumento de proteção dessas “normas fundamentais” e seu uso é excepcional, devendo ser utilizada em último caso, quando os outros instrumentos constitucionais de proteção da CF/88 não forem suficientes, como, por exemplo, a ADI e a ADC. Contudo, ultimamente, a ADPF ganhou importância, refletindo no aumento que tem sido verificado no número de ações desse tipo ajuizadas.
Nessa direção, o STF, já julgou várias ADPFs, interpretando o que seria os chamados “preceitos fundamentais”, dentre outros: as cláusulas pétreas normas constitucionais que não podem em regra serem alteradas, inclusive as que estão previstas no art 5º da CF, quais sejam os direitos e garantias individuais (ADPF 33); o direitos sociais e difusos como à saúde, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (arts. 196 e 225 CF/88) e a busca pelo desenvolvimento sustentável (ADPF 101); a guarda do pluralismo de ideias, prevista no art. 206, III, da CF/88 (ADPF 526); e a autonomia administrativa e financeira da Defensoria Pública (art. 134§ CF/88) (ADPF 307).
Explica Masson:
“Por fim, como não há indicação (nem na Constituição, tampouco na lei regulamentadora) de quais são, especificamente, os preceitos fundamentais, o STF determinou, no julgamento da ADPF 1-RJ competir à Corte "o juízo acerca do que se há de compreender, no sistema constitucional brasileiro, como preceito fundamental". Assim, os preceitos fundamentais serão extraídos da Constituição por interpretação feita pelo Supremo Tribunal Federal.” (MASSON, 2016, p.1135).
Nesse contexto, segundo o art. 1º da lei nº 9.882/96 a arguição de descumprimento de preceito fundamental “(...) terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público”, ou seja, o objeto da ADFP, também é indeterminado, porque, “ato do Poder Público" é muito genérico, significa qualquer ato de autoridade pública, seja ele normativo judicial ou administrativo, é passível, em princípio, de ser objeto de ADPF, desde que respeitados outras premissas. A crucial é o critério da subsidiariedade, ou seja, a ADPF será arguida quando não houver outro instrumento eficaz para sanar a ofensa a CF/88, é o que prevê o art. 4º, § 1º da lei 9.882/99 “Não será admitida arguição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade”
Nesse ínterim, o principal julgado do STF sobre o tema dos preceitos fundamentais é a ADPF nº 33- PA, onde segundo o relator, Min. Gilmar Mende
“Assim, ninguém poderá negar a qualidade de preceitos fundamentais da ordem constitucional aos direitos e garantias individuais (are. 5°, dentre outros). Da mesma forma, não se poderá deixar de atribuir essa qualificação aos demais princípios protegidos pela cláusula pétrea do are. 60, § 4°, da Constituição, quais sejam, a forma federativa de Estado, a separação de Poderes e o voto direto, secreto, universal e periódico. Por outro lado, a própria Constituição explicita os chamados princípios sensíveis, cuja violação pode dar ensejo à decretação de intervenção federal nos Estados-membros (arr. 34 VII) (...)”
Logo, os preceitos fundamentais são um conjunto de normas constitucionais, que de acordo com o entendimento do STF, juntas formam o que há de mais importante na Constituição Federal 1988.
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988
BRASIL. lei 8.882 (1999). Lei do processo e julgamento da arguição de preceito fundamental. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1999.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. —8.ed.rev. e atual. de acordo com a Emenda Constitucional n.76/2015- São Paulo: Saraiva, 2014, p.334
MASSON, Nathalia. Curso de Direito Constitucional.- 4.ed. ver e atual de acordo com Novo CPC, EC 84/2014 e EC 90/2015. São Paulo: Jus Podivm, 2016, p.1135
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