Quais obstáculos, levam a demora da recuperação judicial e da falência?
A Constituição Cidadã, disciplina no art. 5º, LXXVIII – “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” [1], assim, é direito fundamental de toda pessoa ter suas demandas tanto administrativas quanto judiciais apreciadas dentro do prazo proporcional e de forma rápida. Nesse mesmo sentido o Código de Processo Civil, instrumentaliza, o princípio da celeridade, e, por conseguinte da economia processual, primordial para as partes que querem ter a solução do litigio. É o que regulamenta o art. 4º do CPC “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”[2].
Nessa perspectiva, a lei de falências, 11.101/05, por ter natureza jurídica processual, também, inspirada pela CF/88, e em consonância com o CPC, que, inclusive, é aplicado subsidiariamente à norma, traz, nas suas disposições gerais no art. 75§ 1º “o processo de falência atenderá aos princípios da celeridade e da economia processual, sem prejuízo do contraditório, da ampla defesa e dos demais princípios previstos no CPC”[3]. Desta forma, tanto o processamento da recuperação judicial quanto da falência deverá acontecer, em regra, de forma célere, combatendo a morosidade, com a finalidade de resguardar a economia processual não onerando os cofres públicos, mas, respeitando os prazos processuais, e mais, o exercício regular do contraditório e da ampla defesa.
Todavia, o primeiro empecilho à realização do princípio da celeridade é a própria conjuntura da empresa que se encontra em situação de desorganização financeira e econômica, assim, o obstáculo inicial é a burocracia para fazer o inventário dos bens e reunir o balanço contábil e patrimonial, calcular ativos e passivos da companhia e juntar todos os outros documentos necessários para dar entrada no pedido de recuperação judicial, inclusive, anexar todas as certidões e provas que atestem a viabilidade econômica da companhia, bem como a listas dos credores.
Nessa senda, depois de aceito o plano de recuperação judicial pelo juízo competente e pelos credores, outro problema é as partes não aceitarem métodos alternativos de solução de conflitos, como por exemplo, a mediação e a conciliação ou a arbitragem ou até mesmo partirem para recuperação extrajudicial se for possível. No caso de mediação e da conciliação, é lei falimentar que diz que deve ser incentivada até mesmo pelo administrador judicial (art.22, I, j) e, em qualquer grau de jurisdição, porque, corrobora para solução pacífica do litígio chegando a um acordo que seja proveitoso para ambas as partes, qual seja, credores e devedor (es) e diminui a quantidade de processos tramitando dentro das Varas de Recuperação Empresarial.
Entretanto, os prazos nos processos de recuperação judicial e falimentar são contados em dias corridos, diferentemente do CPC, que já foi alvo de judicialização e chegou às Cortes Superiores. Ainda assim, esse prazo pode ser prorrogado pelo juízo falimentar, e, na hipótese de prorrogação, fazer um acordo em qualquer fase do processo agilizaria, e, muito, a solução do conflito de interesses. Sobre a contagem de prazos em dias corridos no processo recuperacional e falimentar, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp nº 1.699.528/MG, ementa, infra.
“RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ADVENTO DO CPC/2015. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. FORMA DE CONTAGEM DE PRAZOS NO MICROSSISTEMA DA LEI DE 11.101/2005. CÔMPUTO EM DIAS CORRIDOS. SISTEMÁTICA E LOGICIDADE DO REGIME ESPECIAL DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA.(...). 2. A Lei de Recuperação e Falência (Lei 11.101/2005), apesar de prever microssistema próprio, com específicos dispositivos sobre processo e procedimento, acabou explicitando, em seu art. 189, que, "no que couber", haverá incidência supletiva da lei adjetiva geral. (...). 4. A forma de contagem do prazo - de 180 dias de suspensão das ações executivas e de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial - em dias corridos é a que melhor preserva a unidade lógica da recuperação judicial: alcançar, de forma célere, econômica e efetiva, o regime de crise empresarial, seja pelo soerguimento econômico do devedor e alívio dos sacrifícios do credor, na recuperação, seja pela liquidação dos ativos e satisfação dos credores, na falência. (...)6. A adoção da forma de contagem prevista no Novo Código de Processo Civil, em dias úteis, para o âmbito da Lei 11.101/05, com base na distinção entre prazos processuais e materiais, revelar-se-á árdua e complexa, não existindo entendimento teórico satisfatório, com critério seguro e científico para tais discriminações. Além disso, acabaria por trazer perplexidades ao regime especial, com riscos a harmonia sistêmica da LRF, notadamente quando se pensar na velocidade exigida para a prática de alguns atos e na morosidade de outros, inclusive colocando em xeque a isonomia dos seus participantes, haja vista a dualidade de tratamento. 7. Na hipótese, diante do exame sistemático dos mecanismos engendrados pela Lei de Recuperação e Falência, os prazos de 180 dias de suspensão das ações executivas em face do devedor (art. 6, § 4°) e de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial (art. 53, caput) deverão ser contados de forma contínua (...)[4]”
Nessa direção, outro entrave é que o falido pode tentar também fazer manobras com o intuito de procrastinar, como por exemplo, buscar a impugnação da avaliação de ativos, e como essas impugnações tendem a demorar em serem apreciadas, representam um gargalo ao princípio da celeridade. Ademais, é entrave no processo falimentar e recuperaciaonal, o volume de petições pleiteando questões dentro do processo.
Soluções para combater a demora
Nesse caminho, as inovações trazidas pela lei que combatem a morosidade e a burocracia no processo de recuperacional e falimentar e confirmam o postulado da celeridade processual são:
a) a possibilidade de o empresário durante a recuperação judicial fazer um contrato de financiamento com o devedor, em respeito ao principio da manutenção das atividades da empresa (art. 69-A);
b) no caso de falência, também é possível vender os bens do estabelecimento para pagar as dividas por meio de leilão presencial, eletrônico ou hibrido (142, I), em especial o pregão eletrônico dá ritmo ao processo e diminui as despesas;
c) quando da promulgação da lei 11.101/05, o legislador estabeleceu o prazo improrrogável de 180 dias para suspensão das ações contra o devedor, com o intuito de enseja a elaboração do programa de recuperação judicial, porem, o STJ, firmou o parecer de que essa prorrogação poderia acontecer na hipótese em que a lentidão para definição do plano recuperacional, não decorresse do descaso do empresário devedor, contudo, essa divergência entre a lei e a jurisprudência causou insegurança jurídica, por isso as recentes alterações feitas na lei em 2020 no art. 6º, §4º resolvem o problema e fixa que o prazo é “prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal”[5], assim, o prazo limite, agora é de 360 dias, o que é legítimo para o termino de todas as negociações.
Logo, esse microssistema processual recuperacional e falimentar, já avançou muito em critérios normativos para a solucionar o inadimplemento do empresário insolvente, contudo, o próprio Poder Judiciário deve incentivar os meios complementares de solução de conflitos e as partes devem aderir a essa cultura de solução dos litígios em homenagem ao principio da celeridade.
BIBLIOGRAFIA
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial (livro eletrônico): direito de empresa/ Fábio Ulhoa Coelho.- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. 5,22 Mb; PDF
BRASIL. Lei de Falências (2005). Lei de Falências (11.101/05). Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 2005.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.699.528/MG. Recorrente: Martplast Comercio de Embalagens LTDA- em recuperação judicial. Relator: Min. Luis Felipe Salomão. Brasília, 10 de abril de 2018. Página 1
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